Pois é! Aqui está outro elemento fundamental da nossa criancice; "O comboínho".
As memórias das crianças estão povoadas de pequenas grandes coisas...
"O comboínho" é daquelas coisas que está sempre presente nos locais de passeio que visitamos com nossa família.
"O comboínho" estava sempre presente nos locais das excursões onde a minha mãe me levava. Eram daquelas excursões lá da terra, com 56 passageiros (não sei exactamente quantos lugares eram), que normalmente enchiam, e ainda, levavam clandestinamente mais dois ou três crianças, nos degraus da camioneta.
O ponto de encontro para a excursão era sempre cedíssimo, aí pelas cinco e meia da manhã, porque havia um importante trabalho de logística a tratar antes do arranque da camioneta. Assim, as pessoas iam aparecendo carregadas com os seus pesados merendeiros (ainda a fumegar), que eram cuidadosamente armazenadas pelo sr. motorista na mala da camioneta.
Outra das coisas, era a disputa feroz que havia entre algumas das senhoras, pelos melhores lugares da camioneta que seriam (não sei porquê) os lugares dianteiros.
Depois destas e doutras situações, ainda havia sempre que esperar por alguém que tinha adormecido, ou que já era normal chegar atrasado, fazendo com que camioneta arrancasse sempre com mais de uma hora de atraso.
Normalmente, a camioneta ficava em condições de arrancar para o inicio do passeio por volta das 7hoo; e como a espera já começava a ser muita, as pessoas já acondicionadas nos seus lugares à mais de hora e meia, os cheiros começavam a sentir-se.
Os odores das pessoas, que por motivos hormonais, ou por motivos de higiene pessoal menos cuidada, ou pelos sacos comida guardados na parte de cima do autocarro, ou por outro qualquer motivo não referenciado aqui, o certo é que antes da viagem começar, havia sempre um de nós (crianças) que para ajudar a festa inicial, e em solidariedade com o cenário, acabava por vomitar.
-"Coitadinho, o menino enjoa nas viagens?"
Só me apetecia dizer (quando me tocava a mim vomitar):
-"Não minha senhora, não enjoo na viagem, enjoo é do cheiro que a senhora liberta, juntamente com o cheiro do seu pequeno almoço, esse coelho que a senhora esta a comer..."
Mas como é óbvio nada disto dizia porque a senhora era amiga da minha mãe, e ia sempre nas excursões que ela fazia parte, e eu era um menino bem comportado.
Naquele tempo, estas excursões eram normalmente sempre aos mesmos locais:
Ao Bom Jesus de Braga, ao S. Bentinho da Porta Aberta no Geres, ou a S. Luzia de Viana do Castelo.
Em conclusão, demorava mais os preparativos para arrancar, que a demora do percurso da viagem.
Uma vez chegados ao destino, a camioneta estacionava, as pessoas saiam derreadas da viagem, iam á missa, e visitavam os arredores do santuário religioso até a hora do almoço.
Arranjava-se um bela sombra, estendiam-se as toalhas, abriam-se os merendeiros, e dava-se inicio á verdadeira festa, ou romaria...
Até dava gosto vê-los comer e beber (a sério!), este ritual era tão bem elaborado, que naquele momento dava-me orgulho ser Português do Minho, carago!!!
Qual etiqueta qual quê; aqui toda a gente comia os panados, os frangos assados ou guisados, os coelhos, os rissóis e os croquetes, as pataniscas, e todas as restantes e gordurosas iguarias, á mão...
O ritual da bebida era para mim o que mais me impressionava, a destreza do Sr. Manel, que num movimento de rotação sobre a cabeça, colocava o garrafão, do bom vinho tinto verde, no ombro e deixava cair o néctar de Baco na malga de barro...
O som do vinho a cair na malga, e som com que as malgas eram sorvidas pelos excursionistas, ainda hoje estão presentes nos meus sonhos...
Como que por arte de magia, e para completar a farra, aparecia sempre uma concertina, seguido de umas desgarradas com uns valentes palavrões, daquelas do tipo judas, só que cantadas. As senhoras em surdina, ou com um riso escondido, mostravam-se encantadas pela erudita e popular musica, cantada no terreno do "piquenique".
Depois do almoço, seguia-se prontamente o lanche, e enquanto uns cantavam e outros ouviam, uns jogavam á sueca e outros á malha.; eu e as outras crianças víamos durante todo o tempo da excursão, "O Comboínho" passar e a tocar o sino. O desejo de nele andar era grande, mas nunca me atrevi a pedir á minha mãe para dar uma voltinha, talvez por pensar que era demasiado caro...
Ao entardecer, depois de juntar e arrumar os pertences de cada um, as pessoas começavam a entrar para a camionete, para o regresso a casa.
O regresso, fazia sempre cantando mais umas musiquinhas malandras, seguidas de umas anedotas da Sra. Virgínia, que é a minha mãe e é uma exímia contadora de anedotas, que todas as senhoras adoram ("Oh! Virgininha, conta aquela do Sr.Abade, do sacristão, e do Porquinho de chocolate...). Havia ainda tempo para rezar o terço, e fazer um peditório para o sr. motorista, que no meio disto tudo, era um santo.
Excursão atrás de Excursão, comigo vinha sempre o eterno sonho e desejo de um dia andar no "Comboínho"!
Sonho que se realizou quando já tinha 23 anos de idade, na cidade de Mirandela (outros dos destinos turísticos português, onde existe "O Comboínho").
2 comentários:
Gostei imenso, fez-me recuar no tempo...
BIBA A BÓ e os passeios que ela organizava... inda m lembro d ir a alguns desses passeios
é caso para dizer... ainda sou do tempo... =)
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